domingo, 17 de março de 2024

SEMANA DA LEITURA - “Uma página por dia, não sabe o bem que lhe fazia” - 2.º Ciclo

 2.º Ciclo


Para iniciar a semana da leitura, aqui fica um pequeno texto humorístico do mesmo autor das aventuras de Astérix e Obélix. Trata-se de uma turma de meninos brincalhões, mas com muita personalidade. Ora oiçam.

Esta manhã, chegámos todos à escola muito contentes, porque vão tirar uma fotografia da turma que será para nós uma recordação para ficar para toda a vida, como nos disse a professora.

O fotógrafo também lá estava com a sua máquina, e a professora disse-lhe que tinha de se despachar, senão íamos faltar à aula de matemática.

O Aniano, que é o melhor da aula e o menino-bonito da professora, disse que seria uma pena não termos matemática, porque gostava disso e tinha feito bem todos os problemas.

O Eudes, um colega que é muito forte, queria dar um murro no nariz do Aniano, mas o Aniano tem óculos e não se lhe pode bater tanto quanto se gostaria.

A professora pôs-se a gritar que éramos insuportáveis e que se aquilo continuasse não haveria fotografia e iríamos para a aula.

O fotógrafo decidiu que tínhamos de nos pôr em três filas; a primeira fila sentada no chão, a segunda em pé à volta da professora, que estaria sentada numa cadeira, e a terceira em pé em cima de caixas. Tem de facto boas ideias, o fotógrafo.

As caixas, fomos procurá-las à cave da escola. Divertimo-nos muito, porque não havia muita luz na cave e o Rufus tinha enfiado um saco velho na cabeça e gritava: «Hu! Sou o fantasma.»

De volta ao pátio, a professora bateu com a mão na testa. «Mas vocês estão todos sujos», disse ela. Era verdade, ao fazer palhaçadas na cave tínhamo-nos sujado um pouco.

A professora não estava contente, mas o fotógrafo disse-lhe que não era grave, tínhamos tempo de nos lavarmos enquanto ele arrumava as caixas e a cadeira para a fotografia.

«Então», disse o fotógrafo, «vão com juízo tomar os vossos lugares para a fotografia. Os maiores em cima das caixas, os médios de pé, e os pequenos sentados». Nós lá fomos e o fotógrafo estava a explicar à professora que se consegue tudo das crianças quando se é paciente, mas a professora não o conseguiu ouvir até ao fim. Teve de nos vir separar, porque queríamos todos ficar em cima das caixas.

A professora disse-nos que nos fazia um último aviso, depois seria a aula de matemática, então pensámos que precisávamos de ficar quietos e começámos a instalar-nos.

Instalámo-nos. Cá eu estava sentado no chão, ao lado do Alceste. O Alceste é o meu colega que é muito gordo e que passa a vida a comer. Estava a morder numa fatia de pão com doce e o fotógrafo disse-lhe para deixar de comer, mas o Alceste respondeu que ele precisava de se alimentar. «Larga essa fatia!», gritou a professora, que estava sentada precisamente atrás do Alceste. O Alceste ficou tão espantado que deixou cair o pão com doce na camisa. «Lindo serviço», disse o Alceste, tentando rapar o doce com o pão.

A professora disse que só havia uma coisa a fazer, era pôr o Alceste na última fila para que não se visse a nódoa na camisa. «Eudes», disse a professora, «dê o lugar ao seu colega.» «Não é meu colega», respondeu o Eudes, «não ficará com o meu lugar e que se ponha de costas na fotografia.»

A professora zangou-se e deu ao Eudes o castigo de conjugar o verbo: «Eu não devo recusar-me a dar o meu lugar a um colega que deixou cair uma fatia de pão com doce na camisa.»

O Eudes não disse nada, desceu da caixa e veio até à primeira fila, enquanto o Alceste ia para a última fila. Isso provocou uma certa desordem, sobretudo quando o Eudes passou pelo Alceste e lhe deu um murro no nariz.

O Alceste quis dar um pontapé ao Eudes, mas o Eudes esquivou-se, é muito ágil, e foi o Aniano que apanhou com o pé, felizmente no sítio onde não tem óculos.

Isso não impediu o Aniano de se pôr a chorar e a berrar que já não via, que ninguém gostava dele e que queria morrer.

A professora começou a distribuir os castigos de uma forma bem gira, todos tínhamos montes de linhas para escrever, e por fim a professora disse-nos: «Agora, têm de se resolver a estar quietos. Se forem simpáticos, levantarei todos os castigos.

Vá, vão fazer pose, fazer um lindo sorriso, e o senhor vai-nos tirar uma bela fotografia!» Como não queríamos aborrecer a professora, obedecemos.

Todos sorrimos e ficámos em pose. Mas, quanto à recordação para ficar para toda a vida, falhou, porque demos conta que o fotógrafo já lá não estava. Tinha-se ido embora, sem dizer nada.

Sempé, Goscinny, O menino Nicolau

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